Mais de R$ 13 bilhões foram liberados em nome de menores; entidades alertam para vulnerabilidade do sistema e defendem revisão profunda dos processos.
Um levantamento recente revelou uma grave distorção no sistema de crédito consignado do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS): cerca de R$ 12 bilhões foram liberados em nome de crianças e adolescentes, por meio de aproximadamente 763 mil contratos ativos. Com valor médio de R$ 16 mil por operação, esses débitos vêm sendo descontados diretamente de benefícios sociais como o BPC e pensões.
O presidente da Associação Brasileira de Defesa dos Clientes e Consumidores de Operações Financeiras e Bancárias – ABRADEB, Raimundo Nonato, alerta para o impacto dessa irregularidade:
“Estamos diante de um cenário de extrema vulnerabilidade. Há casos de bebês com poucos meses de vida já endividados por operações feitas sem qualquer controle adequado”, afirma.
Ele lembra que, apenas em 2022, foram identificados 15 casos de menores de um ano com dívidas geradas sem autorização judicial. Entre os episódios mais chocantes está o de um bebê que, nascido em maio, já acumulava mais de R$ 15 mil em débitos até dezembro daquele ano.
A crise teve origem na Instrução Normativa nº 136, vigente entre agosto de 2022 e agosto de 2025, que flexibilizou a contratação de empréstimos por representantes legais sem necessidade de decisão judicial. A falta de fiscalização permitiu que instituições financeiras liberassem crédito de forma indiscriminada.
Para conter o problema, o INSS revogou a normativa e publicou a Instrução Normativa nº 190/2025, restabelecendo a obrigatoriedade de autorização judicial para empréstimos em nome de menores, tutelados e curatelados. Desde maio de 2025, o órgão também passou a exigir biometria do beneficiário, medida que tem ampliado a segurança e reduzido tentativas de fraude.
Apesar dos avanços recentes, milhares de contratos continuam ativos, gerando descontos compulsórios que comprometem direitos fundamentais das crianças. Segundo Raimundo Nonato:
“As irregularidades persistem e ainda exigem atuação firme do sistema de Justiça e dos órgãos de fiscalização. Nossa prioridade é proteger os menores e garantir que essas práticas não se repitam.”
O advogado João do Vale, representante da Associação Nacional dos Centros de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente – ANCED, reforça que o enfrentamento do problema tem sido feito de maneira articulada. Ele destaca que a ANCED e a ABRADEB ajuizaram conjuntamente a ação que busca responsabilizar as instituições financeiras e garantir a revisão dos contratos:
“Essa mobilização coletiva é essencial para impedir que crianças continuem expostas a práticas abusivas. Precisamos de políticas públicas efetivas e de um controle rigoroso sobre operações envolvendo beneficiários vulneráveis.”
As entidades seguem atuando em ações civis públicas, como amicus curiae, e colaborando com o Ministério Público Federal na defesa dos menores, além de integrarem uma coalizão voltada à proteção da infância. A pauta central é clara: mais transparência, mais fiscalização e mais responsabilização.








